segunda-feira, fevereiro 05, 2007

A educação bancária e o débito automático

Existe um conceito em educação conhecido como "educação bancária". Significa aquele estilo de ensinar muito comum até hoje, em que o professor é o dono da verdade e vem para derramar o conhecimento na cabeça dos alunos, usando de práticas não muito agradáveis, como a decoreba, por exemplo.

Todos nós, com certeza, nos lembramos de professores que nos faziam decorar nomes e teoremas com o único objetivo de tirar nota boa na prova do final do mês. Passava a prova e nunca mais ouviríamos falar naquelas coisas. No máximo, decorávamos até o vestibular, quando finalmente poderíamos ficar livres daquela lista gigantesca de fórmulas.

Um dos problemas deste tipo de educação é que ela não leva à reflexão e sim à perda de tempo. Resumindo, ela é emburrecedora. Até hoje me pergunto o que seria de mim se não tivesse aprendido química orgânica. Resposta: a mesma coisa, claro.

Muito bem. Em 1968, no auge da repressão do regime militar, o governo suspendeu dos currículos de primeiro e segundo grau as disciplinas de sociologia e filosofia e substituiu por Moral e Cívica e OSPB (organização social e política brasileira). Pretendia-se ensinar aos alunos valores como amor à pátria e à bandeira, ou seja, socava o lema Brasil, ame-o ou deixe-o na cabeça do pessoal, num exemplo típico de educação bancária.

Com o fim da ditadura, voltaram as matérias filosofia e sociologia. Mas com o tempo, conseguiram piorar de novo o negócio. É o que fiquei sabendo por um certo ex-colega de faculdade, cuja mãe é professora das duas disciplinas numa escola de Divinópolis.

Ela resolveu pedir as contas no colégio por não aceitar que as aulas seguissem rigorosamente a apostila montada pela escola, como queria a diretoria. Até então, ela pretendia ministrar aulas conforme a realidade dos alunos, o que eles vêem no dia-a-dia, etc.

Mas acontece que algumas faculdades já incorporaram filosofia e sociologia nos vestibulares, e a escola em questão deve ter preferido adotar a via da decoreba para essas matérias a fim de garantir o nome dos alunos na lista dos primeiros lugares, justificando assim as altas mensalidades bancadas pelos pais.

Nos meus tempos de colégio, memorizei produtos notáveis, fatoração de polinômios, conjuntos de números racionais e irracionais e mais um monte de outras maluquices matemáticas. Saí fininho para o vestibular. Passei na prova e, vários anos depois, me deparei com um sério problema matemático: a minha conta de luz. Vejamos.

Em junho do ano passado consumi 87 kWh, o que multiplicado por uma tal constante que valia R$ 0,438916 dá R$ 38,18. Mais R$ 2,14 de uma tal taxa de iluminação pública, o resultado é R$ 40,32. Muito bem.

No último mês de dezembro, em compensação, tudo ficou mais caro. A taxa de iluminação pública foi para R$ 8,58, a constante passou para R$ 0,651474, o consumo foi para 125 kWh e o resultado da conta foi R$ 81,41, mais que o dobro de seis meses antes.

Liguei para a Cemig mas tudo o que consegui ouvir foi uma gravação de um conjunto peruano de música boliviana.

Então resolvi tentar entender como se chegou a esses valores. Fui descobrindo que existe uma alíquota de 30%, um valor de ICMS de 24,42; um tal de valor Pasep de R$ 1,10; um valor Cofins de R$ 5,06 e ainda valor de distribuição de R$ 27,43; de encargos setoriais de R$ 4,61; tributos de R$ 30,58. Descobri ainda que 37,56% do preço da conta são impostos, que a média de kWh consumidos é de 4 por dia, que existe uma resolução da Aneel e que a Cemig trabalha para sua segurança.

No fim da conta, se eu resolvesse fazer as contas acho que, além de não conseguir chegar a lugar nenhum, o preço ia passar dos duzentos reais. Resolvi parar de brincar. Fiquei puto, descobri que sou burro pra caralho e desisti de somar essas coisas. Coloquei a conta no débito automático, pra poupar minha calculadora. Pelo menos, a educação bancária me poupou de ir ao banco.