domingo, novembro 26, 2006

Agora eu vou ficar ainda mais chato


Passou quatro dias que repercuti o post de 22 de outubro sobre a omissão de informações por parte de algumas lojas. E nem sabia eu que, um mês antes daquilo, em 20 de setembro, o presidente Lula já havia assinado o decreto presidencial 5.309, que trata de quê? Da omissão de informações por parte das lojas!

Na postagem do mês passado, havia reclamado da filial da Drogaria Araujo da minha rua, onde simplesmente não conseguia encontrar os preços dos produtos. Só consegui comparar os preços das pastas de dente quando a atendente me mostrou que as etiquetas estavam pregadas do lado das embalagens. Ou seja, onde não dava pra ver de cara. O cliente tem que sair tirando uma por uma das caixinhas pra ver quanto custa.

E não era só com a pasta de dente, não. Saí andando pela loja e vi que estava tudo desse jeito: xampu, sabonete, remédio, etc. Não tenho nenhum receio em afirmar que tal atitude é sacanagem pura da loja, tentativa grotesca de enganar, trapacear, engalobar, passar a perna no cliente. Tenho plena convicção disso, até porque enviei e-mail com a reclamação à loja e não recebi nada além de uma resposta-padrão agradecendo pelo "comentário".

Pois bem, agora todas as drogarias, mercearias, sacolões, supermercados, lojas de conveniência, etc, ficam obrigadas a manter informações sobre preços e condições de pagamento de forma absolutamente explícita e precisa, sem margens a dúvidas, conforme vocês podem ler nesta matéria.

Agora, os bacharéis de direito que freqüentam este blog podem me tirar uma dúvida. Pelo que sei, o consumidor tem o direito de não aceitar a quantidade oferecida pelo fabricante quando quiser levar um produto. Ou seja, se quiser levar apenas um iogurte no lugar dos seis embalados juntos, ele pode.

Se isso for verdade, dia 20 de dezembro, quando o decreto entra em vigor, volto lá na drogaria. Aviso que vou escarafunchar todas as prateleiras em busca de informação clara e precisa. Além disso, vou tentar executar a compra de 1 (um) cotonete. Não tô falando de uma embalagem Johnson&Johnson com 50 cotonetes. É só um mesmo. Uma unidade.

E ai deles se não aceitarem.

sábado, novembro 25, 2006

Música do dia

Vou festejar


Chora
Não vou ligar
Chegou a hora
Vais me pagar
Pode chorar
Pode chorar

É o teu castigo
Brigou comigo
Sem ter porquê

Eu vou festejar
Vou festejar
O teu sofrer
O teu penar

Você pagou com traição
A quem sempre lhe deu a mão

sexta-feira, novembro 24, 2006

Please, read this post


Esta postagem bem que poderia ter título em português, mas tem motivo pra ser em inglês.

Depois de um bom tempo sem tevê a cabo em casa, cansado da mesma programação, assisti por um acaso ontem à noite a um episódio de uma série qualquer no Warner Channel.

No intervalo comercial, a voz do locutor anunciava os destaques da programação com os seguintes dizeres: Não perca, neste fim de semana, no Prime Time da Warner, The New Adventures, The Class e Return to Me.

Não me lembro exatamente a frase de tal locutor, mas fica minha dúvida: pelo que eu me lembre, a língua oficial do Brasil é o português.

Nessas horas eu me lembro de quando ainda estava no segundo grau, já pensava em estudar comunicação e fui fazer um daqueles projetos-decoreba de feira de ciências sobre publicidade. Entrevistamos, na ocasião, um publicitário bem-sucedido no mercado, que nos disse: "É bom colocar o nome do grupo de vocês em inglês, porque fica mais chique".

Olha só que merda! Um publicitário incutindo na cabeça de estudantes que o inglês é mais chique que o português! Fuck you! Ou melhor dizendo, vai tomar no cu mesmo.

Não sou tão radical como o presidente da Câmara dos Deputados, Aldo Rebelo, que criou projeto de lei para proibir estrangeirismos. Mas, por outro lado, temos que reconhecer que existem abusos por aí. E nada me tira da cabeça que os publicitários tem um boa parcela de contribuição nisso.

Minha reclamação pode parecer frescura, mas acho uma total bobagem algumas coisas que a gente vê, tipo Marmita Delivery ou Feijoada Light.

Fico pensando que se o governo federal lançasse o Family Purse no lugar do Bolsa-Família, as dondocas até o apoiariam. "Nossa, você viu a última do Squid(*), que chique?"

Na prática, defendo o seguinte: as tevês a cabo precisam reservar parte de suas grades a uma programação local. Entretanto, apesar de elas arrecadarem os tubos com o dinheiro das mensalidades e da publicidade, duvido muito que elas fariam isso expontaneamente.

Portanto, só mesmo uma lei obrigando as emissoras de tevê a cabo a destinarem progressivamente uma parte maior da programação a produções nacionais faria efeito.

Funcionaria, por exemplo, da seguinte forma: no início, meia hora da programação seria nacional. Aí progressivamente os canais iriam aumentando este espaço, até uma quantidade considerada razoável, que seja de duas horas diárias, por exemplo. Além disso, as emissoras teriam que privilegiar também produtos regionais dentro deste espaço, ou seja, cada região do País teria programação local também na tevê fechada.

Tal medida iria beneficiar os milhares de produtores independentes de audiovisual espalhados pelo Brasil que não têm onde exibir seus produtos. Além disso, valorizaria a cultura local.

Mas é só uma idéia, nada mais do que isso. Por enquanto.

E você? Quer fazer alguma de útil para o Brasil ao invés de assistir comercial de tevê a cabo em inglês? Clique aqui e saiba como colaborar para o Alfabetização Solidária.

(*) Squid, de acordo com o tradutor do Google, significa Lula em inglês.

quarta-feira, novembro 22, 2006

Resposta das Casas Bahia

Depois de um tempo que deixei este post sobre omissão de informações (precisamente um mês), as Casas Bahia responderam a este blog por e-mail, com o seguinte conteúdo (reproduzido abaixo na íntegra):

"Prezado Paulo,
A Casas Bahia agradece sua manifestação e esclarece que por estratégia da rede, as promoções da empresa são diárias, semanais, quinzenais, mudando constantemente a forma de pagamento (para 15, 30, 60 dias) bem como sua categoria de produtos.
Todas as promoções são diariamente anunciadas e têm prazo de validade."

A mensagem veio da assessoria de imprensa da rede. Na prática, não me satisfaz. Como consumidor, continuo com uma pulga atrás da orelha. E não é só com as Casas Bahia, mas com várias outras redes de lojas que vemos por aí, como a Ricardo Eletro, por exemplo, que não respondeu ao Uaipod.

As duas redes de lojas, a meu ver, são as mais agressivas do mercado. Aparecem todos os dias no horário nobre com anúncios que parecem extraordinários, ofertas "imperdíveis". Sempre são promoções perecíveis ou, para usar as palavras da assessoria das Casas Bahia, "com prazo de validade". Prazos que, aliás, são curtíssimos, em muitos casos, de apenas um dia.

Agora pense bem. Uma loja do tamanho das duas citadas tem milhares e milhares e milhares, pilhas e pilhas de eletrodomésticos em estoque. Vamos supor que um dia eles resolvem fazer uma megapromoção da torradeira elétrica Arno. Aí vem a propaganda: "É só amanhã nas Casas Bahia, você não pode perder, oferta imperdível, olhou levou, não deixe a oportunidade passar, é a sua chance de comprar"...

Fica 25 segundos da propaganda nesta lavagem cerebral, como se a oferta fosse a mais generosa de todos os tempos. Nos outros cinco segundos restantes, anuncia "Ferro elétrico Arno por R$ 39 ou mensais de R$ 3,90. É só amanhã!"

De tanto ver essa propaganda repetida todos os dias na televisão, um dia com tevê, outro dia com forno, outro dia fogão, depois geladeira, depois máquina de lavar... o que fica no imaginário das pessoas é que a rede de lojas em questão é mais generosa do mercado, a mais barateira.

Entretanto, você vai nas Casas Bahia, depois passa na Ricardo Eletro, passa numa outra loja qualquer e vê que os preços, exceto daquele único produto em promoção, são rigorosamente os mesmos. As promoções são parecidas. Os produtos, as marcas, as condições de financiamento, tudo a mesma coisa. Qual a diferença de uma pra outra, então?

A diferença é que as propagandas de umas são mais apelativas que as de outras. No lugar de apelativas, você pode usar o termo que quiser: sensacionalistas, enganosas, escandalosas, abusivas, vai da percepção de cada um.

E olha que nem falei de outros dois problemas que vejo nestas propagandas. Um: as parcelas de financiamento. São mais ou menos assim: R$ 890 ou mensais de R$ 89. O número de mensalidades vem pequenininho, lá no cantão. Isso deixa a impressão de que são 10x de R$ 89, mas na verdade são, 12, 14, 16 vezes. Os mais desavisados se ferram nesta.

Dois: as letrinhas que explicam as regras de financiamento são tão pequenas que se algum dia eles escreverem que os clientes devem doar um de seus rins à loja, muitos vão acabar parando na mesa de cirurgia.

Então, você quer fazer algo de útil ao invés de ficar vendo comercial de novela? Algumas dicas:

1) Entre no site do Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária) e reclame de toda propaganda que você (e não eu) considerar abusiva.

2) Não caia no conto da propaganda. Compre só aquilo que você sabe que precisa, e não aquilo que a televisão lhe diz para comprar.

3) Evite comprar financiado. Dê preferência para negócios à vista.

segunda-feira, novembro 20, 2006

A Justiça e a maioridade penal


Aceitei o convite do Pedro Markun, editor do Jornal de Debates, e postei sobre a redução da maioridade penal. Fiquei surpreso ao ver a quantas andava o debate sobre o assunto e perceber que havia um juiz, que por sinal é meu conterrâneo de Divinópolis, defendendo a tese de reduzir para 16 anos a maioridade penal. Para ele e para tantos outros que são a favor ou contra, deixei o artigo que segue abaixo:

"Prefiro tratar a redução da maioridade penal não como uma questão individualista, como propôs meu conterrâneo, o juiz Núbio de Oliveira Parreiras, neste Jornal de Debates. Pelo que pude observar, o magistrado optou por tratar a questão até mesmo como biológica, ao propôr que jovens acima de 16 anos têm capacidade física e mental para entender o que é lícito ou ilícito. Portanto, na visão do juiz, se cometerem algum ato ilícito, adolescentes de 16 ou 17 anos devem pagar por ele como os demais adultos.

Na minha visão, a questão sobre o conhecimento sobre o que é lícito ou ilícito deve ser encarada socialmente e não biologicamente, psicologicamente ou coisa que o valha. Porém, pensar desta maneira me parece lamentavelmente difícil a um juiz que enxerga a juventude como os filhos das classes média e alta – um exemplo: Parreiras tenta explicar que dando responsabilidade aos filhos, os pais ficarão mais tranqüilos em emprestá-los os automóveis e permitir que eles freqüentem casas noturnas.

Vamos, então, a um outro lado da questão. Ao invés de nos ampararmos em exemplos da classe média, pensemos em situações que acontecem nos locais onde a questão da violência é mais flagrante: as favelas das grandes cidades. Para começar, o fato de as favelas concentrarem os maiores índices de criminalidade dos centros urbanos referenda a tese de que a violência é um problema social.

Pois bem, agora pensem bem nos jovens que vivenciam a realidade das favelas. Exemplos nos são mostrados em vários documentos históricos, como nos filmes Pixote, de Hector Babenco, Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, Uma Onda no Ar, de Helvécio Ratton, ou no livro Abusado, de Caco Barcelos, só para citar alguns. Todos mostram como alguns (não todos) jovens da periferia vão cair na criminalidade. De tanto conviver com crimes, injustiças sociais, descaso de autoridades (inclusive judiciais) e dificuldades de ascenção social, consideram a criminalidade rotineira, e na hora de diferenciar o que é certo ou errado (lícito ou ilícito), podem optar pelo lado que nós, do lado de cá do asfalto, consideramos ser o incorreto.

Dessa forma, penso que a redução da maioridade penal seja apenas uma enganação, uma tentativa de justificar o descaso da sociedade com relação às questões sociais que inflam os índices de violência urbana. É nada mais do que uma forma de tapar o sol com a peneira. De nada vai adiantar reduzir a maioridade penal se as distorções sociais não forem amenizadas. Se os problemas de hoje não forem encarados de frente, daqui a 30 anos a discussão poderá tomar caminhos ainda mais intolerantes. Se a redução da maioridade penal for aprovada, nada se resolverá e, pela lógica, vamos a debates mais inflamados, como a pena de morte, por exemplo. E daí vamos para uma ciranda cada vez mais perigosa.

Qualquer brasileiro que ler a Constituição do início ao fim verá que, no papel, a lei brasileira é muito bonita. Pois bem, os magistrados querem fazer algo de verdadeiramente útil ao invés de jogar lenha na fogueira da intolerância? Se quiserem, basta lutar todos os dias com verdadeiro afinco para que as leis que já existem sejam aplicadas. Será melhor para juízes, advogados, réus, culpados, inocentes, adolescentes, jovens e adultos. Será melhor para todos. Basta querer fazer. Eis o desafio."

sexta-feira, novembro 17, 2006

Angenor de Oliveira (1908-1980)


Voltemos a falar de samba no UaiPod. O nome da vez é o de Angenor de Oliveira, o popular Cartola, fundador da Estação Primeira de Mangueira e gênio do samba.

Cartola nasceu em 1908, filho de uma família de classe média carioca. No início da adolescência, após a morte do avô, foi morar no morro da Mangueira. Começou a trabalhar de pedreiro, quando ganhou o apelido dos amigos. Foi expulso de casa pelo pai aos 17 anos. Na escola, não se deu bem: encerrou os estudos ainda no primário. No mercado de trabalho formal, também não foi pra frente e viveu fazendo bicos, como camelô, flanelinha, pintor e porteiro.

Aos 19 anos, se lançou no samba, vendendo a música Que infeliz sorte para o cantor Francisco Alves. Começava ali uma série de composições que, embora não tenham lhe rendido dinheiro, embalaram os carnavais cariocas. Em 1928 fundou, ao lado de seis amigos, a escola de samba da Mangueira.

Naquela época, os blocos estavam começando a se organizar em escolas e, na primeira disputa, a Mangueira se sagrou campeã do carnaval, feito eternizado na letra de Sala de Recepção, um dos grandes sucessos de Cartola:

Habitada por gente simples e tão pobre / Que só tem o sol que a todos cobre / Como podes Mangueira cantar / Pois então saiba que não desejamos mais nada / A noite a lua prateada, silenciosa / Ouve as nossas canções / Bem lá no alto do cruzeiro / Onde fazemos nossas orações / E temos orgulho de sermos os primeiros campeões.

Cartola teve sucessos gravados por outros grandes nomes da música brasileira, como Beth Carvalho, Chico Buarque, Cazuza, Marisa Monte, Elza Soares, Elizeth Cardoso e Paulinho da Viola. Só a música O sol nascerá teve mais de 600 regravações:

A sorrir eu pretendo levar a vida / Pois chorando, eu vi a mocidade perdida / Finda a tempestade / O sol nascerá / Finda esta saudade / Hei de ter outro alguém para amar.

O mundo é um moinho, Alvorada, Tive Sim, As rosas não falam e Acontece são alguns outros sucessos do mestre Cartola, que só gravou o primeiro disco em 1974, aos 65 anos.

A vida de Cartola dá muito mais que uma postagem de blog. E quem tiver interesse em saber mais pode ficar de olho no documentário Cartola, de Hilton Lacerda e Lírio Ferreira, aplaudido no festival de cinema do Rio e na mostra de São Paulo. A estréia em circuito comercial está prevista para janeiro do ano que vem.

sexta-feira, novembro 10, 2006

Aos papagaios do meu Brasil


Os papagaios são uma ave típica do Brasil. Algumas espécies são encontradas também na África ou na região sul da Ásia, porém é no Brasil que se encontra a maior variedade desta espécie. Não é à toa que, nas primeiras viagens dos portugueses em solo tupiniquim, os portugas se encantaram com os caprichos desta ave, cuja principal proeza é a de imitar os sons da fala humana.

O encanto dos portugues para com os papagaios foram registrados em diversos escritos. A clássica carta inaugural de Pero Vaz de Caminha, por exemplo, cita a ave por cinco vezes. Durante os dois primeiros séculos de colonização, não foram raras as encomendas do animal por parte de nobres europeus, que gostavam de ter o bicho em casa, dada a sua fácil domesticação.

Entretanto, o ciclo do ouro, iniciado em meados do século XVII, levou outros encantos aos nobres e o papagaio teve que se contentar em ser relegado a um segundo plano. Com o constante desmatamento em áreas de mata atlântica e de cerrado, a espécie por pouco não entra em extinção.

Por outro lado, atualmente os bandos de papagaios vêm crescendo em território brasileiro. Eles costumam se procriar de norte a sul do País, mas a espécie que mais tem crescido se encontra em meios urbanos. Tanto em áreas de classe social mais alta quanto mais baixa, há incidência de espécimes silvestres. Porém, costuma se ver na classe média uma propensão maior à reprodução de papagaios domesticados.

É bem verdade que os papagaios oriundos da classe média urbana atual têm mais virtudes do que aqueles encontrados in natura por Pero Vaz de Caminha. Além de repetir oralmente fonemas de conversação que escutam de seus domesticadores, também costumam se manifestar em blogs e espaços abertos para comentários em sites mantidos por jornalistas, estudiosos ou populares.

Como é de se esperar desta espécie, o repertório de fala não é muito variado. Não se pode esperar de um papagaio que tome conhecimento de uma notícia, reflita sobre a mesma, entenda os dois lados da questão e sugira um assunto novo, uma nova proposta sobre o tema que não tenha sido colocada por seus domesticadores.

Estudos científicos apontam que hoje os principais domesticadores de papagaios, assim como antigamente, encontram-se na nobreza. Revista Veja e O Estado de S. Paulo são apontados como os líderes desta domesticação. Eis um exemplo claro da manifestação de um papagaio, retirado da lista de comentários de um texto escrito por Bernardo Kucinski sobre a democratização da mídia no site da agência Carta Maior:

Pois é , continua a máxima esquerdista do faça o que eu digo mas não o que eu faço . O texto acima é muito bonito , chega quase a ser real e a ter fundamentos , mas basta novamente olhar a questão sob o prisma da realidade , dos fatos e veremos que mais uma vez estamos diante da abordagem Rolando Lero , tão util ao PT (...) Se não fosse a mídia , até hoje nem saberíamos que são Marcos Valério , Francenildo , Freud , e por aí vai...


Trata-se de um caso típico de papagaiada. O texto de Kucinski mostra abertamente como houve deturpação de fatos por parte da Folha de S. Paulo e posteriormente pelo Estado de S. Paulo para fazer parecer que a proposta de democratização da mídia em discussão atualmente é uma tentativa de manipulação e de controle da imprensa.

O papagaio em questão deu-se a repetir o discurso de que a mídia é correta, investigativa, justa e que, por isso, não podemos nos dar ao luxo de abrir as portas para criação de uma nova mídia, sem prejuízo desta que já comanda todos os espaços de discussão. Provavelmente, ignora que a criação de novos espaços de imprensa pode beneficiar todos os lados da sociedade, inclusive àqueles que hoje são oposição.

Ignora tudo isso, pois provavelmente, como vários outros papagaios, repete que a proposta é deste governo de petralhas cujo presidente não sabe de nada e nada vê, que só quer calar a voz daqueles que tem fome de justiça, pois só quer saber de dar esmolas para ganhar a eleição, pois tem que dar emprego e não dinheiro para o povo, pois arrumou uma bocada para o filhão, pois o Lulla é corrupto sim e... cansei de papagaiar.

Quer fazer alguma coisa de útil pelo País ao invés de papagaiar por aí? Uma sugestão: clique aqui e entre na luta pelo fim do contrabando de animais silvestres.

quarta-feira, novembro 08, 2006

Pixote, a lei do mais fraco (1979, de Hector Babenco)


Em 2005, estouraram no estado de São Paulo 25 rebeliões em unidades da Fundação Estadual pelo Bem Estar do Menor, a Febem. Diante de uma estatística como esta, pode-se concluir que a fundação poder servir para qualquer coisa, menos pelo bem-estar de qualquer pessoa.

Do lado de cá das grades, quando as rebeliões apareciam na tevê, o debate parecia pontuado por bandos de papagaios. Bordões em defesa da pena de morte, da tortura, da redução da maioridade penal ou do massacre do Carandiru eram repetidos sistematicamente em qualquer conversa sobre o assunto.

O fato é que as falhas dos sistemas prisionais, sejam eles para adultos ou para adolescentes, não são falhas na legislação. A lei, como se diz muito por aí, é bonita no papel. A diferença é que, na prática, ela não é aplicada.

Ou seja, se as leis que já existem não são aplicadas, que garantia podemos ter de que novas leis que vierem a surgir o serão? Pensando por este lado, fica claro que a solução para qualquer problema relacionado à violência no Brasil não é fruto de falhas da lei, mas sim do sistema que aplica essas leis. E é estranho pensar que ainda há pessoas querendo criar mais e mais leis e que, cada vez mais, o caminho dessas pessoas segue em direção à intolerância.

Mais estranho ainda é perceber que a discussão sobre as falhas dos sistemas de reclusão de adolescentes infratores não é nova. Para se ter uma idéia, 26 anos antes da gigantesca onda de rebeliões nas Febems de São Paulo, uma importante obra-prima do cinema brasileiro tentava levantar o problema que viria a estourar.

Trata-se de Pixote, a lei do mais fraco, filme de Hector Babenco lançado no final da década de 70. O filme narra a história do garoto Pixote (Fernando Ramos da Silva). Nascido na periferia de São Paulo e abandonado pelos pais, é encaminhado a um reformatório, onde entra em contato com todo tipo de violência praticada por menores infratores.

Depois de uma rebelião, motivada pelos desmandos dos diretores do reformatório, Pixote organiza uma fuga em massa. Junto com amigos, se envolve em assaltos, tráfico de drogas, prostituição e assassinatos.

Pixote é mais do que um mero filme triste sobre a vida de um garoto. É, também, mais do que uma profecia. É, no mínimo, um alerta. Um aviso de que, se encararmos de frente os problemas graves que afetam o Brasil hoje, não precisaremos no futuro buscar na intolerância a solução para os obstáculos que preferimos ignorar no passado.

Uma Onda no Ar (2002, de Helvécio Ratton)

A atual lei de imprensa, em vigor desde 1967, prevê que apenas emissoras de rádio e televisão credenciadas pelo governo podem existir. Isso significa que é o poder executivo quem controla quem pode ou não pode fazer rádio ou televisão no Brasil.

Desde quando tal lei foi implementada, no início dos governos militares, a concessão de rádio ou de televisão passou a valer como moeda de troca política. Ou seja, políticos ou entidades que se alinhavam ao pensamento vigente conseguiam a licença. Isso explica por que até hoje a maioria das emissoras afiliadas às grandes redes de tevê pertencem a oligarquias regionais e grupos politicamente dominantes em várias regiões do país.

A lei, entretanto, ao mesmo tempo em que benfeciava um grupo restrito de pessoas da elite, aos poucos ia gerando reação entre os mais populares. E começaram a surgir, na década de 70, em diversas regiões do Brasil, rádios comunitárias. Elas apareciam, na maioria das vezes, fruto do trabalho pessoal de líderes de comunidades oprimidas e em muitos casos se apoiavam em movimentos populares e pastorais da igreja católica.

Um dos casos mais emblemáticos desta disputa de poder entre povo e elite foi o da Rádio Favela, de Belo Horizonte. A história desta rádio, hoje reconhecida como patrimônio da cidade, é retratada em Uma Onda no Ar.

O filme conta a história de quatro jovens que viviam no Aglomerado da Serra, conjunto de vilas onde hoje moram mais de 160 mil pessoas. Jorge (Alexandre Moreno), por um acaso foi parar numa estação de rádio instalada no alto do morro. Passou a visitar o local, clandestinamente, várias vezes, e comentou com os amigos Zequiel (Adolfo Moura), Roque (Babu Santana) e Brau (Benjamin Abras) sobre a vontade de criar uma rádio que servisse como porta-voz da comunidade da favela.

Zequiel foi o primeiro a levar a idéia a sério. Como era técnico em eletrônica, encorajou os demais amigos a comprarem as peças necessárias para fazer um transmissor FM. Os amigos se empenharam na empreitada e logo estava no ar "a voz do morro", que, de início, ocupava a faixa de horário destinada nas rádios comerciais à "Voz do Brasil".

Racismo, violência, pobreza, e outros problemas comuns àquela realidade entraram no ar e logo a rede também chegou ao asfalto. Aí começaram os problemas: a polícia passou a perseguir os novos radialistas, sob a alegação de que a rádio instigava a violência.

Por outro lado, a rádio ganhou a simpatia de uma jornalista e de um advogado, virou assunto de jornal e recebeu até prêmio das Nações Unidas pelo papel de conscientização que marcou na vida da favela da Serra.

Se, mesmo depois de mais de 20 anos da queda da ditadura militar, muito ainda se discute sobre liberdade de expressão no Brasil, Uma Onda no Ar mostra como a democratização da comunicação pode ser útil para a construção de um país menos desigual.

terça-feira, novembro 07, 2006

Garrincha, Estrela Solitária (2003, de Milton Alencar Jr.)


Manoel dos Santos, o Mané Garrincha, tinha quase todos os defeitos que os mais controversos jogadores de hoje podem ter. Era mulherengo, tinha grande apreço por um gole de uma cachaça, não gostava de treinar e sumia da concentração nas vésperas dos jogos.

Entretanto, tinha uma qualidade que o diferenciava de todos os outros: a paixão por jogar futebol. Garrincha até ganhou algum dinheiro jogando bola, mas era atleta simplesmente porque gostava. Cada jogo da seleção ou do Botafogo era uma diversão.

Talvez por isso o gênio das pernas tortas, por mais controverso que seja, fez aquilo que fez dentro de campo: ganhou títulos pelo Botafogo; carregou nas costas a seleção bicampeã de 62, que contou com Pelé apenas no primeiro jogo; e levou centenas de milhares de torcedores aos estádios.

Garrincha, estrela solitária conta a história do craque, interpretado por André Gonçalves, a partir de memórias de pessoas que o cercaram durante sua conturbada vida. São casos narradas pela ex-esposa e amante Iraci, pela namorada e cantora Elza Soares (Taís Araújo), pelo jornalista Sandro Moreyra (Henrique Pires) e pelo colega de Botafogo e seleção Nilton Santos (Alexandre Schumacher), apontado por muitos até hoje como o maior lateral esquerdo de todos os tempos.

As situações apresentadas mostram a incrível simplicidade de um gênio. Como não sabia ler, o craque não se importava com o fato de o Botafogo o obrigar a assinar contratos em branco. Só depois de anos de carreira é que começou a desconfiar do fato de receber menos que outros jogadores.

As primeiras cenas, passadas na cidade carioca de Pau Grande, já dão a tendência do que seria a vida do jogador. Iraci, a namorada, começa a desconfiar da traição do namorado e o flagra com Nair. Quando Nair engravida, Garrincha se casa e a então namorada oficial passa a ser amante. Porém, Nair não pode se mudar para o Rio de Janeiro e a situação se inverte: Iraci volta a ser a oficial.

Todos esses encontros e desencontros amorosos são pontuados pela ascenção da carreira do jogador, que chega ao auge na Copa do Chile, em 1962. Foi em Santiago, capital chilena, que Garrincha assumiu o romance com Elza Soares. A partir deste romance, o jogador começou a cobrar mais do Botafogo mais justiça nos contratos, ao mesmo tempo que se entregava ainda mais ao alcoolismo.

Elza ficou mal falada, boatos diziam que ela atrapalhava a carreira do jogador. Os dois chegaram a se exilar na Itália após o golpe militar de 64, pois a cantora havia participado de comícios em apoio ao ex-presidente João Goulart.

Outras várias histórias também são contadas. Para saber mais, só assistindo.

Veja que mentira

Como jornalista, há muito tempo deixei de ler a Veja. E, como bebum, várias vezes sou questionado em mesas de buteco sobre o porquê disso. Tentei por várias vezes mostrar como a revista, na minha opinião, não pratica jornalismo e, sim, panfletagem. Noticia conforme os interesses de seu dono (já comentei sobre isso até mesmo neste blog, nesta e nesta postagem).

Desta vez, vamos a um caso concreto. Na edição que chegou às bancas em 29 de outubro, Veja nos solta, na página 61, a seguinte notinha:

Como leitor do blog do Tas, posso comentar com absoluta certeza de que o blogueiro goza de mais credibilidade do que tal revista. Tanto um quanto o outro mostram-se posicionados ideológica e politicamente. Porém, Marcelo Tas o faz abertamente, enquanto Veja se diz imparcial e independente.

Se fosse mesmo o que diz ser, Veja teria publicado ou ao menos comentado a carta que Marcelo Tas enviou à redação da mesma. Entretanto, não o fez. Na correspondência, o blogueiro mostra abertamente que todas as acusações feitas pela revista não são verdadeiras.

Porém, do alto do posto que ocupa, de revista semanal de informação de maior circulação do País, Veja o ignorou. Existe alguma chance de democracia nisso?

Clique aqui para ir ao blog do Tas, onde está publicada a carta em resposta às acusações da revista.

segunda-feira, novembro 06, 2006

Cama de Gato (2000, de Alexandre Stockler)


Depois de dez anos que ficaram conhecidos como a "década perdida", os anos 90 prometiam uma virada. Foi o tempo da globalização, do início da internet, um período em que passou a se acreditar que um dia todas as fronteiras do mundo seriam extintas. No Brasil, os anos 90 foram das grandes privatizações, do livre mercado, da competição cada vez mais acirrada entre os jovens pela entrada num restrito mercado de trabalho.

A idéia de globalização tal qual era imaginada, entretanto, não vingou por completo. E, pela lógica da ação e reação, a ilusão frustrada acabou como desilusão. Sobra para aqueles que mais dependem dos sonhos para viver: os jovens.

Cama de Gato é um filme crítico sobre a juventude atual, cujo comportamento se moldou pelos ideais propagados na década de 90. Conta a história de três jovens recém saídos do segundo grau: Cristiano (Caio Blat), Gabriel (Cainan Baladez) e Chico (Rodrigo Bolzan). Por um lado, estão desiludidos com esta idéia de globalização, mas, por outro, levam satisfeitos a vida de estudantes de classe média alta de São Paulo.

Um dia depois de uma festa regada a muita cerveja e drogas, os três conversam na casa de Cristiano, que recebe o telefonema de uma garota. Ele a convida para um encontro em casa, e os outros dois armam um plano para transformar o encontro em orgia.

O resultado é que a tentativa acaba em estupro coletivo no quarto de Cristiano. Com um detalhe: a webcam de Cristiano flagra o crime e coloca na internet sem que os três saibam. A garota não suporta o estupro e morre no local.

Daí para a frente, os três armam diversas situações para evitar que sejam descobertos.

O mais interessante do filme é que ele foi montado tendo como base depoimentos reais de jovens paulistanos. No início e após o final da história, são apresentadas entrevistas curtas com adolescentes e jovens sobre temas como violência, religião, comportamento, miséria e injustiça. São destes depoimentos que brotam as atitudes dos três personagens centrais da trama.

Filmes sobre juventude sem rumo não são novidade. E Cama de Gato é mais um que vale a pena assistir.

Terra Estrangeira (1995, de Walter Salles)


Faz 16 anos, mas parece que foi ontem a retenção do dinheiro da poupança dos brasileiros pelo ex-presidente Collor. Entretanto, o impacto desse plano econômico desastrado e desastroso não sai da memória de quem tinha no banco o dinheiro guardado para trocar de carro, comprar apartamento, mudar de cidade ou investir em qualquer outra coisa.

Essa sensação de desespero que se abateu diante de todos os brasileiros, sejam eleitores de Collor ou de Lula, no dia 15 de março de 1990, é o ponto de partida da trama que move Terra Estrangeira, dirigido em 1995 por Walter Salles.

Paco (Fernando Alves Pinto) era um jovem paulista que sonhava em ser ator no Brasil. Sua mãe, a imigrante espanhola Manuela (Laura Cardoso), entretanto, queria se mudar com o filho para o País Basco. Com a minguada aposentadoria, ela havia acumulado todo o dinheiro necessário para a viagem na caderneta de poupança.

Porém, a poucos dias de convencer o filho a fazer a viagem, o presidente Collor anuncia o seqüestro da poupança. Manuela, ao ver o pronunciamento na televisão, não suporta o desespero e morre sentada ao sofá.

Paco fica, então, sozinho no mundo e sem dinheiro. Frustrado, decide fazer a viagem que a mãe sonhava. Para isso, se envolve com contrabandistas de obras de arte, que lhe oferecem a viagem a Portugal em troca do carregamento de mercadorias.

Na Europa, ele se envolve com Alex (Fernanda Torres), uma brasileira frustrada que queria fazer a vida no velho continente, mas já se contentava com a idéia de voltar para o Brasil após o assassinato de seu namorado, Miguel (Alexandre Borges), que seria o receptador da carga trazida por Paco do Brasil.

No final das contas, o acaso leva ao encontro de Paco e Alex.

Filmado em preto e branco por opção do diretor, Terra Estrangeira é um filmaço. Podem assistir por minha conta. Depois, confirmem ou critiquem minha opinião aqui no Uaipod.

Detalhe interessante: de acordo com Walter Salles, a música Vapor Barato entrou por acaso na trilha sonora do filme. O diretor conta que flagrou a atriz Fernanda Torres cantando esta música para se concentrar. Para ela, a música tinha tudo a ver com a cena a ser interpretada. O cineasta adotou a idéia e Vapor Barato entra na cena mais emocionante do filme.

quarta-feira, novembro 01, 2006

Antônio Carlos Bernardes Gomes (1941-1994)


As eleições acabaram e já gastei muita palavra reclamando da imprensa nas últimas postagens. Novamente atendendo a pedidos, escreverei menos, e desta vez sobre música. E, neste segundo post sobre o assunto (o primeiro foi sobre Beth Carvalho), volto ao samba, meu ritmo preferido.

O Samba está na moda em Belo Horizonte, caiu no gosto dos universitários e as casas como o Clube do Samba Goiabada Cascão, o Bar Opção e o Reciclo estão lotados todos os fins de semana.

Nada melhor, então, que falar de samba. E o intérprete da vez no UaiPod é o Antônio Carlos Bernardes Gomes. Quenzis? O velho Mussum, dos Trapalhões, gente boa pra cacildis. Isso mesmis, é verdadis.

Mussum nasceu em 7 de abril de 1941 e foi criado no morro da Mangueira, no Rio de Janeiro, onde morou até 1981. Ganhou o apelido do colega Grande Otelo. Ao lado dos Originais do Samba, gravou 12 LPs, o primeiro deles lançado em 1969. Dentre os sucessos do grupo, músicas como "Assassinaram o Camarão", "Cadê Tereza" e "Chiclete de Hortelã".

Chiclete de Hortelã, aliás, é uma música que tem a cara do Mussum. A letra, de Zeca Pagodinho, começa com os versos:

Eu já mandei pedir à Odete / Para me mandar /Um chiclete de hortelã /Para tirar / Esse cheiro de aguardente /De romã do ceará


Esta e outras músicas estão no disco Água Benta, lançado em 1978. Não encontrei a capa do disco na rede.

Mussum não é lá daqueles mais afinados, mas suas músicas são divertidas e nos dão a certeza de que ele gostava do que fazia. Antonio Carlos Bernardes Gomes morreu em 1994 depois de um transplante de coração malsucedido.

Lembrete: abuse do seu Emule pra encontrar essas e outras pérolas.