terça-feira, outubro 31, 2006

O jornalismo como está e o futuro das faculdades

No final do primeiro turno destas eleições, ficou um forte cheiro de desconfiança no ar em relação à imprensa, como de costume. O episódio da investigação policial sobre a compra do dossiê revelou também uma desconfiança em relação aos jornalistas que apuraram o caso e os que participaram da divulgação da foto do dinheiro. Quem perdeu o bonde dessa história pode relembrar aqui ou aqui, ou aqui.

O caso ganhou repercussão em revistas, blogs e listas de discussão por e-mail das quais participo. Ficou no ar a dúvida: os jornalistas teriam agido certo ao divulgar material obtido de maneira ilegal? Não teriam cometido nenhum crime por burlar a lei para conseguir um furo jornalístico?

Vale lembrar que não é esta a primeira vez que a discussão vem à tona. Ela já aconteceu, por exemplo, no caso dos grampos telefônicos que culminaram com a demissão do ex-ministro das Comunicações de FHC, Luiz Carlos Mendonça de Barros e de outros quatro integrantes daquele governo.

Bom, nas discussões que observei, notei que os jornalistas encaram de maneira muito natural o fato de colegas de profissão se envolverem num negócio fora-da-lei para conseguir o furo jornalístico. É difícil pensar, entretanto, se alguém negaria ao delegado Bruno as fotos, pois os repórteres recebem salário de seus patrões e foram até a polícia, naquela ocasião, com a tarefa de voltar com o material.

Pois bem. Minha intenção aqui não é meramente discutir se, no caso do jornalismo, os fins justificam os meios, como muitos jornalistas tentaram justificar no tal episódio. Fica, na minha cabeça, a seguinte dúvida: diante de um mercado de imprensa absolutamente fechado (há poucas empresas jornalísticas e muitos profissionais em busca de emprego) e de grandes veículos de comunicação visivelmente voltados à manipulação de informações, não estariam os jornalistas dispostos a fazer qualquer coisa para se manterem no mercado, numa espécie de "topa-tudo-por-emprego"?

Não seria a hora de os jornalistas pensarem um pouco mais com senso crítico sobre o desserviço que prestam à credibilidade dos órgãos de imprensa? Acredito que sim. Mas por outro lado, tenho a certeza de que isso dificilmente acontecerá. O motivo?

Acho que ainda precisamos pensar em como melhorar o nível das faculdades de jornalismo para tornar os profissionais mais críticos em relação a seu papel nas redações da grande imprensa.

Como fazer isso? Tenho a minha sugestão. Primeiro, precisamos deixar claro que a cobertura destas eleições colocaram na pauta de urgência um assunto que já vem sendo debatido há décadas: a democratização da comunicação.

É nesse contexto, de urgência por democracia no campo da comunicação, que as faculdades de hoje entregam os jornalistas ao mercado. E é para esse contexto que devem preparar seus alunos. É preciso reformular no sentido de preparar alunos não apenas para buscar vagas no mercado já instituído, mas também para descobrir possibilidades em um novo mercado que deve crescer nos próximos anos: o da mídia alternativa.

Me assusta, então, o comercial de um centro universitário que vi na televisão outro dia desses. Tal instituição de ensino comprou espaço comercial na grade de programação das tevês para exibir ao público seus laboratórios: de fisioterapia, de odontologia, de radiojornalismo, de televisão, entre outros. E bradava aos espectadores: "para nós, isto é uma sala de aula". Gabava-se de que, com tanta estrutura, seus alunos vão se dar bem no mercado.

Coincidência ou não, no dia seguinte vi na tevê (estou assistindo tevê demais!) um programa produzido por alunos desta mesma faculdade. Era um programa de cultura, cinema, música. Trazia algumas entrevistas, como a do Skank, por exemplo, feitas pelos estudantes. Tinha, também, material de agências de notícias sobre os filmes em cartaz nas salas de BH.

Agora pensemos bem: o que um estudante de jornalismo aprende ao reeditar uma matéria de agência de notícias para seu programa semanal na tevê? Ele pode apreender a editar vídeo pra tevê, a editar texto jornalístico, a estabelecer critérios de exibição das notícias, etc. Basicamente, tem noções de técnicas jornalísticas.

Ele pode aprender tudo isso e fazer um programa bonitinho com o que tem em mãos. Fica faltando só um detalhe: ele simplesmente ignora o motivo pelo qual o jornalismo um dia foi criado e o papel que um repórter tem, que é de ir à rua buscar informação com as pessoas, e não simplesmente re-divulgar aquilo que já está pronto.

Nota-se que há uma forma errada de educação. A que preço? Ao preço de milhares e milhares de reais que os estudantes pagam para ter à disposição laboratórios que são miniaturas da grande imprensa. O laboratório de rádio é uma miniatura de Itatiaia, o de tevê, miniatura da Globo e o de jornalismo impresso, miniatura do Estado de Minas.

E qual o resultado disso? Os alunos, normalmente bancados pelos pais, poderão se encontrar melhor no mercado que está instituído. Se lhes surgir uma vaga em qualquer grande meio de comunicação, estarão prontos para assumir. Serão portadores de uma técnica infalível de jornalismo, mas, entretanto, não questionarão seu papel enquanto jornalistas. Buscarão o furo pelo furo, farão o jogo da grande imprensa e, no fim das contas, contribuirão para deixar as coisas exatamente como estão. Receberão salário no fim do mês e justificarão, assim, o investimento que os pais lhe deram no período da faculdade.

Como sair dessa ciranda? Dou a minha sugestão. É preciso pensar numa alternativa barata, mais viável que os laboratórios estruturados, que leve o estudante a refletir sobre a profissão que vai assumir e seu papel para modificá-la, tendo em vista a urgência de democratização.

Situação parecida aconteceu na década de 1970 com o curso de medicina da Universidade Federal de Minas Gerais. Naquele tempo, os grandes hospitais investiam em qualidade técnica e a faculdade, para acompanhar, precisava investir em laboratórios de grande porte. Até que chegou um limite e a faculdade investiu num novo módulo de educação: o internato rural.

A faculdade resolveu, na ocasião, tirar os futuros médicos das salas com ar-condicionado e equipamentos de última geração e levá-los para o contato com o povo em cidades pequenas, carentes de atendimento médico. O resultado foi que os estudantes tiveram contato com uma nova realidade, na qual estavam inseridos mas não tinham senso crítico para reconhecê-la.

Quase trinta anos depois (o internato rural teve início em 1978), hoje vemos a valorização dos programas de saúde da família, numa espécie de democratização do acesso à saúde. Claro que ainda há muitos desafios a vencer, mas nesta área a mudança na formação dos universitários foi um passo visivelmente importante.

Do ponto de vista da faculdade de comunicação, como poderia ser um programa de internato rural? Em convênio com prefeituras de cidades pequenas, a faculdade teria acesso a um estabelecimento, onde os alunos, que irão morar nessas cidades por alguns meses, irão produzir comunicação social a partir do zero. Irão conversar com pessoas, investigar demandas e propôr soluções.

Soluções que, aliás, não faltam. Os alunos poderiam propôr um periódico para a tal comunidade, com o objetivo não de serem simples porta-vozes de notícias, mas sim de preservar o patrimônio cultural e a memória oral, tão presente em pequenas comunidades. Para os alunos interesados em outras áreas, há outras possibilidades: rádio comunitária, video documentário, livro-reportagem, etc.

Ao alavancar uma proposta de comunicação do zero, em contato direto com uma comunidade, os estudantes terão ciência de seu real papel enquanto formadores de opinião, enquanto comunicadores e, claro, enquanto cidadãos. E terão a cabeça pronta para descobrir que é viável investir em novas propostas de comunicação.

A proposta está lançada.

segunda-feira, outubro 30, 2006

Sobre o resultado das urnas

Hoje também estou nervoso. Por outros motivos, que não cabe esclarecer aqui. Mas vou aproveitar para descarregar.

Antes de mais nada, queria deixar claro que procurei todas as empresas citadas no post anterior: Ricardo Eletro, Casas Bahia, Shopping Del Rey e Drogaria Araujo. Nenhuma delas respondeu à reclamação. Preferiram se omitir. Pelo menos a caixa de comentários da postagem deixa claro que mais pessoas concordam comigo. Talvez um dia essas e outras empresas nos respeitem e eu não precise mais vê-las como estelionatárias.

A respeito da eleição. Já foi discutido em diversos blogs a possibilidade (que se confirmou) de Alckmin obter, no segundo turno, uma votação menor que no primeiro. Isso mostra que a candidatura tucana estava inchada, e foi além do que realmente poderia ir. Motivo? Na minha opinião: foi uma candidatura cuja proposta não fez o menor sentido.

O tema da ética é importante, mas não se resumia a uma simples discussão sobre "de onde veio tal dinheiro?". Alckmin sabia que não podia levar esse tema muito adiante, pois iria sobrar tanto para o PSDB quanto para o PFL. E, quando tentou partir para outros temas, se deu mal.

Muita gente (no caso, eleitores tucanos) ainda se questionam sobre os métodos e as propostas de Lula para o país. A verdade é que desde João Goulart Lula é o único presidente ligado a movimentos sociais e não à elite econômica e intelectual do País. Ele ocupa hoje um posto que, fora o período Jango, sempre esteve ocupado por alguém que, de uma forma ou de outra, era intimamente ligado ao mesmo pensamento colonial que comanda o Brasil desde que Pedro Álvares Cabral aportou po aqui.

É esse pensamento que sustenta a tese de que o problema do Brasil é econômico e não social. É esse pensamento que defende a idéia de que o Brasil vai pra frente quando resolvermos os problemas de déficits, superávits e das estatísticas.

Esse pensamento nega a idéia de que, distribuindo renda, a economia vai se movimentar e o crescimento vai acontecer de baixo para cima.

Por outro lado, Alckmin tentou insistir que o desenvolvimento do Brasil passa por grandes obras do Rio Grande do Sul ao Acre.

Ou seja, sustenta uma tese de desenvolvimento baseada num estado investidor e fornecedor de empregos, paradoxalmente calcado num corte de impostos e de gastos.

Resumindo: o pensamento tucano, nesta eleição, não fez o menor sentido. E, quando não há argumentos democráticos para combater uma idéia, a solução para quem está perdendo é a de ir para o tudo ou nada. Em outras palavras: golpe. Foi o que aconteceu com Jango. Esperamos que nunca mais se repita. Mas que tem gente querendo, tem.

PS: atendendo a pedidos, voltarei em breve com as postagens sobre o cinema brasileiro. Aguardem e confiem.

domingo, outubro 22, 2006

Sobre a omissão de informações

Andei meio puto com algumas coisas que percebi nestes últimos dias. Vou citá-las uma a uma e gostaria que comentassem se estou xiita ou não:

1. Afixação de preços de produtos na Drogaria Araujo. Fui até lá só pra comprar uma pasta de dente. De frente para a prateleira, entretanto, não conseguia achar os preços. Pedi ajuda a uma funcionária. Ela me mostrou que as marcações estavam na parte do lado das embalagens. Por um momento pensei que tinha pagado mico por ter chamado a funcionária para me ajudar em uma coisa tão simples. Só que andei pela loja e vi que todos os preços estavam afixados em locais não visíveis: ou embaixo ou no lado das embalagens. Não acredito em ocultação ocasional de informação em empresas como a tal drogaria, que tem a maior rede de Belo Horizonte. Nada me tira da cabeça que, quando isso acontece, é intencional.

2. Falta de informações sobre disposição das lojas do Shopping Del Rey. Eu, que já não gosto de ir a shoppings, acho o Del Rey o pior de todos. Ele nos exige uma caminhada de sei lá quantos metros para encontrar a escada rolante certa. Eu, quando tenho que ir a um desses centros de compras, vou sabendo o que preciso comprar. Só que, como não conheço a disposição das lojas, sou obrigado a sair procurando. Facilitaria muito se, neste caso, fosse feito como no Shopping Cidade, que tem a relação das lojas em todos os andares, em ordem alfabética e separada por tipo de serivço prestado. No caso do Del Rey, só perguntando para saber. A impressão é de que eles realmente querem que fiquemos andando feito peregrinos pelo shopping. Relembro, mais uma vez, que não acredito em omissão ocasional de informação em empresas grandes.

3. Comerciais da Ricardo Eletro e das Casas Bahia. Tenho considerado estas duas redes de lojas de eletrodomésticos como as detentoras das propagandas mais apelativas dos últimos meses. Não consigo enxergar nessa história de "só hoje", "corra" ou "aproveite" nada além da tentativa de passar o consumidor para trás. Principalmente porque neste tipo de comercial sempre aparecem aquelas informações em fonte tamanho minúsculo, impossíveis de serem lidas por qualquer ser humano que não tenha superpoderes. Acredito que não preciso mais falar o que penso sobre omissão de informações.

4. Eleitores de Geraldo Alckmin repetindo bordões da revista Veja. Isto tem acontecido em todos os blogs que visito. Quando vejo cidadãos no pleno gozo de seu direito de liberdade de expressão repetir de modo fidedigno o discurso propagado pela Veja, tenho vontade de mostrar a um por um aquele comercial de Guaraná Antarctica que pregava a originalidade. Essa coisa de escrever Lula com dois L cansou. É típico de quem não tem argumento. Num país onde temos o direito (e o dever) de lermos o que quisermos, perceber que ainda existe quem lê apenas uma fonte de informação é deprimente. Está mais do que discutido em blogs respeitáveis (como este, este ou este) e no Observatório da Imprensa o quanto a Veja omite informações para fazer valer seus discursos.

Exceto quanto aos citados no item 4, encaminharei todas as reclamações aos devidos e-mails. Se obtiver resposta, não omitirei informações.

A propósito, também não omitirei a parcialidade deste blog. Recomendo o voto em Lula.

segunda-feira, outubro 16, 2006

Por que fugir do jabá

Outro dia comentei neste blog que faria uma postagem explicando como podemos fazer para fugir do jabá. Mudei de idéia. Vou fazer uma pequena série. E a diferença é que não pretendo explicar como fugir do jabá e sim por que fugir do jabá. Começo discutindo com vocês o motivo que leva uma banda a tocar.

Normalmente, uma banda de música é formada por um grupo de pessoas que, de tanto gostar de fazer música, sonham em, um dia, viver dela. Sonham em poder se sustentar com dinheiro que vem da música. Para isso, precisam fazer suas músicas tocarem nas rádios, precisam aparecer na tevê, precisam fazer shows em casas de espetáculo. Ou seja, precisam fazer sucesso.

Mas, antes de pensar em como uma banda pode fazer sucesso atualmente, é preciso ter conhecimento de como se chega ao sucesso no atual mercado fonográfico brasileiro. E, para entender isso, temos que esclarecer qual é a lógica que prevalece neste mercado ou, em outras palavras, como os artistas e bandas que hoje fazem sucesso conseguiram chegar até lá. Lembrando que esta é uma análise generalizada, suscetível a exceções.

Vamos imaginar uma situação hipotética de uma banda. Ela será ilustrativa, baseada nas opiniões que temos a respeito dos artistas que estão nas paradas de sucesso.

Uma banda de música pop que hoje ocupa grande espaço nas rádios, nos jornais, na televisão e faz shows grandiosos começou, naturalmente, do zero. Provavelmente, tocava na garagem de casa, daí passou a tocar em bares, churrascarias, etc. Até que algumas pessoas perceberam que a música era boa e o som caiu no gosto de alguém.

Depois de tocar nestes lugares reservados, o estágio seguinte para alavancar uma carreira musical parece ser o de ter acesso a uma rádio. Ou seja, dessas pessoas que perceberam que a música era boa, a banda tem que dar a sorte de encontrar alguém que possa a colocar na programação de uma rádio. Para isso, a banda ainda pode, se preferir, tentar buscar um atalho: mostrar um CD de divulgação para o responsável pela programação de uma rádio, por exemplo. Vamos dizer, para resumir, que esta figura é o locutor da rádio.

Consideremos que a música tocou na rádio. Ela pode, agora, cair no gosto de mais pessoas. E, se a sorte soprar a favor da banda, pode ser que alguém ligado a uma gravadora se interesse por ela. Ou seja, depois de agradar a algumas pessoas, chegar a uma rádio, agradar a um grupo maior de outras pessoas, a banda tem que torcer, desta vez, para que alguém de uma gravadora esteja em seu público. Mas, mais uma vez, ela pode buscar um atalho: perguntar ao locutor da rádio se ele tem algum indicado de uma gravadora para tentar mostrar o CD de divulgação. Vamos dizer que esta figura é a do produtor.

Consideremos, pois, agora, que um produtor gostou do que ouviu e resolveu adotar a banda. Para isso, entretanto, ele se encarregará de produzir o material necessário para esta banda fazer sucesso. No caso, além de gravar o CD comercial, o produtor deverá criar material de divulgação para possíveis compradores do CD (cartazes, propaganda na tevê, etc), colocar o CD nas prateleiras das lojas e ainda promover uma agenda de shows que contemple as melhores casas do gênero nas principais cidades.

Para fazer isso tudo, o produtor precisa, evidentemente, de dinheiro. E, para conseguir o dinheiro, ele terá que, evidentemente, convencer alguém a investir nesta banda. Ou seja, este alguém lhe emprestará o dinheiro, que deverá ser devolvido mais tarde acrescido de um lucro. Pela lógica, os produtores são empregados das gravadoras. As gravadoras, por sua vez, têm alguém que controla o dinheiro, decide onde ele vai ser investido.

Em lavanderias, restaurantes, lanchonetes, farmácias, bancas de jornais, quem decide onde o dinheiro vai ser investido é o dono. Pela lógica, não há porque uma gravadora pensar diferente, já que também tem dono e é tão estabelecimento comercial quanto qualquer um destes exemplos. Ou seja, no fim das contas, o produtor, ao adotar uma banda, precisa convencer o dono da gravadora de que ali pode-se encontrar lucro em potencial.

Resumindo: a banda que começou do zero, ensaiou na garagem de casa, tocou em bares e churrascarias e conseguiu agradar a um locutor de rádio; deste, passou para um produtor; por sua vez, este vai recorrer ao dono da gravadora o direito de colocar a banda no mercado. Se o dono da gravadora diz não, está tudo acabado.

Quer dizer, então, que todas as bandas que querem fazer sucesso precisam entrar nesta loteria? Na verdade, acredito que não. Mas então o que fazer? É o que vou tentar comentar numa futura postagem. Até lá.

quarta-feira, outubro 11, 2006

A história de Vou Festejar

Beth Carvalho gravou, em 1978, De pé no chão. Dentre os sucessos do disco está Vou festejar, composição de Neoci, Dida e Jorge Aragão. Alguns anos depois, a música se tornava o segundo hino da torcida mais apaixonada do Brasil – a do Atlético Mineiro. Por qual motivo? Vejamos.

Em 5 março de 1978, terminava, com atraso, o Campeonato Brasileiro de 1977. Naquele ano, por influência da ditadura militar, o campeonato foi inchado, disputado por 62 clubes. Na grande final, o Atlético, time que tinha a melhor campanha, a melhor defesa, o melhor ataque e o artilheiro da competição (Reinaldo, com 28 gols em 17 jogos), recebeu o São Paulo, que estava 10 pontos atrás na tabela.

Valesse o regulamento atual por pontos corridos, o Atlético seria campeão naquele ano. Mas devido aos caprichos do futebol, o jogo terminou em zero a zero e a disputa foi para os pênaltis. Os 113 mil torcedores atleticanos viram a derrota do Galo por 3 a 2 e o São Paulo foi campeão.

No ano seguinte, a charanga do Galo, encarregada de animar a torcida, levou para o Mineirão a música interpretada por Beth Carvalho, acompanhada em coro pelos atleticanos.

E, se não deu pra levar o título nacional, pelo menos em seu estado o esquadrão atleticano não fez feio. Venceu os campeonatos mineiros de 78, 79 e 80, quando então voltou à final do Brasileiro, desta vez contra o Flamengo. Os dois times estavam equilibrados na tabela e a final até hoje é apontada como a mais emocionante da história do Brasileirão. A equipe de Zico venceu a decisão no Maracanã por 3 a 2. Reinaldo, mesmo machucado, fez dois gols na ocasião.

Após aquela final, os torcedores do principal rival do Atlético, o Cruzeiro, começaram a torcer pelo Flamengo, já que o time da raposa sequer poderia dar alguma alegria àquela altura dos acontecimentos.

E, no ano seguinte, o Atlético, que viria a faturar o tetracampeonato mineiro, volta a encarar o Flamengo em uma decisão, desta vez valendo a classificação para as finais da Taça Libertadores da América. Os dois times tinham craques e formavam a base do que viria a ser a seleção brasileira de Telê Santana na Copa de 82, o melhor esquadrão canarinho de todos os tempos.

O confronto entre os dois aconteceu em campo neutro: o estádio Serra Dourada, em Goiânia. Um forte cheiro de armação já contaminava a decisão dias antes de a partida começar. O juiz, José Roberto Wright, atual comentarista da Rede Globo, viajou para Goiás no mesmo avião da delegação do Flamengo e ambos se hospedaram no mesmo hotel.

O resultado em campo foi só a complementação do vexame que já se desenhava: Reinaldo, Éder, Palhinha e Chicão foram expulsos antes dos 35 minutos do primeiro tempo e não houve como terminar o jogo. A vitória foi dada ao Flamengo, decisão que feriu as regras do futebol. Após o fim do torneio, em que o time de Wright foi campeão, a Confederação Sul-Americana de Futebol reconheceu o erro na partida.

Mas a vida continuava e, em Minas, a torcida do Cruzeiro manteve a simpatia pelo Flamengo, apoiando o time carioca nas vezes em que ele atuou em Belo Horizonte. Deixando isso de lado, Atlético voltou a faturar outros três estaduais, sagrando-se hexacampeão mineiro com os títulos de 78/79/80/81/82/83.

Diante da humilhação do hexacampeonato, a torcida cruzeirense que ainda ia aos clássicos se via acuada no Mineirão. Por diversas vezes, muitos choraram ao ver o esquadrão atleticano, formado por Éder, Reinaldo, Palhinha, Luizinho e Cerezo comandar o espetáculo.

E, diante do choro cruzeirense, a torcida atleticana passou a entoar em todos os clássicos a música que viria a ser seu segundo hino, e que hoje é repetida em todas as vitórias do clube:

Chora / Não vou ligar / Chegou a hora / Vai me pagar / Pode Chorar / É o teu castigo / Brigou comigo / Sem ter porquê / Eu vou festejar / Vou festejar / O teu sofrer / O teu penar / Você pagou com traição / A quem sempre lhe deu a mão.

Clique aqui para ouvir e festejar o hino da mais fanática torcida do Brasil na voz de Beth Carvalho.

terça-feira, outubro 10, 2006

Vidas Secas (Clássicos do Cinema Brasileiro - 3)

Por um minuto, pare de fazer o que estiver fazendo. Esqueça do trânsito, esqueça da conta do celular, esqueça do supermercado. Esqueça do seu salário, do capítulo de ontem de Páginas da Vida que você perdeu. Esqueça que o presidente só estudou até a quarta série ou que só tem quadro dedos na mão. Esqueça estas e todas as outras preocupações burguesas que nós temos no dia a dia. Pronto. Agora você pode assistir Vidas Secas.

O filme, dirigido por Nelson Pereira dos Santos, é de 1963. Foi baseado no livro homônimo de Graciliano Ramos e conta a história da família de Fabiano (Átila Iória) atravessando o sertão em busca de sobrevivência.

Logo no início do filme, parece que somos jogados dentro daquela realidade da seca do nordeste. Fabiano, ao lado da esposa Sinhá Vitória (Maria Ribeiro), dos dois filhos pequenos e da cadela Baleia, percorrem uma estrada de terra que parece não ter fim. A cena é longa, silenciosa e nos deixa incomodados ao assisti-la. Quase nos faz sentir aquele incômodo que a família sentia ao andar sob o sol escaldante do sertão.

Eles chegam a uma fazenda, onde Fabiano consegue emprego. O patrão, entretanto, não lhe paga tudo o que deve. Para tentar compensar, Fabiano resolve vender carne na cidade, mas um policial não permite, alegando que ele não pagava impostos. Convidado também pelo policial, ele tenta ganhar dinheiro no jogo, mas é trapaceado e preso injustamente por desacato a autoridade.

Diante de toda essa realidade, as situações pelas quais o protagonista passa sintetizam o que é injustiça social.

Vidas Secas foi indicado ao prêmio de melhor filme em Cannes. Na lista das 360 obras indispensáveis em uma cinemateca, elaborada pelo Instituto de Cinema Britânico, Vidas Secas é o único filme brasileiro. Nelson Pereira dos Santos foi homenageado este ano no Festival de Gramado. Creio que já temos motivos suficientes para ver o filme. Estão todos convidados.

O Assalto ao Trem Pagador (Clássicos do Cinema Brasileiro - 2)

O Assalto ao Trem Pagador tem o mérito de ser referência do gênero policial no cinema brasileiro. Lançado em 1962 pelo diretor Roberto Farias e baseado numa história real, o filme conta a trajetória de um bando de assaltantes liderado por Tião Medonho (Eliezer Gomes) e Grilo Peru (Reginaldo Farias). Armados de metralhadoras e explosivos, o grupo rouba 27 milhões de cruzeiros do trem pagador da Central do Brasil e se torna vítimas de investigação policial.

Porém, o conflito que move o filme não é a investigação e sim o que os assaltantes fazem com o dinheiro. Há uma decisão imposta por Grilo Peru aos assaltantes: ninguém poderia gastar mais do que 10% da quantia em um ano, para evitar desconfianças.

Só que o próprio Grilo rompe o pacto e dana a gastar a grana em uma vida de playboy, com o argumento de que um loiro de olhos azuis não levantaria suspeitas. Enquanto isso, os outros assaltantes têm outras preocupações e usam o dinheiro para ajudar amigos e parentes que vivem na favela ou então para resolver problemas pessoais.

Nas situações com as quais o filme leva o espectador a conviver, há muita coisa interessante. Por exemplo, mostra a imprensa desacreditada na versão de que um grupo de favelados teria a capacidade de arquitetar um roubo daquela dimensão. Pensava-se que era ação de estrangeiros.

Outro detalhe está na confusão que o dinheiro causa quando os assaltantes o levam para a favela. Alguns personagens reclamam de que “pobre tem que roubar pouco, não pode roubar feito rico”.

O Assalto ao Trem Pagador foi construído pelo diretor em uma linguagem clássica, em estilo hollywoodiano, e tem o mérito de subir a favela para trazer uma realidade até então distante das telas. Na primeira semana de exibição, quando esteve em cartaz em 17 salas, o filme levou 365 mil pessoas ao cinema, tornando-o um dos maiores sucessos do Cinema Novo.

O filme em questão foi o primeiro produzido por Luiz Carlos Barreto, o mesmo que produziu Dona Flor e seus dois maridos, a maior bilheteria do cinema brasileiro; além de O Quatrilho e O que é isso, companheiro?, ambos indicados ao Oscar de melhor filme estrangeiro.

Foi também o primeiro filme de Eliezer Gomes, escolhido para o papel de Tião Medonho em um concurso. Até então, ele era motorista de ambulância. O Assalto tem ainda no elenco nomes conhecidos como Grande Otelo e Jorge Dória.

Creio que já temos argumentos suficientes para dizer que o filme é bom. Não vou relatar mais detalhes da trama, pois mais uma vez quero que vocês o assistam. E depois comentem aqui.

Em tempo: na próxima postagem desta série, falarei sobre Vidas Secas. Espero que vocês vejam os filmes antes da eleição e lembrem que o objetivo destas postagens é ajudar a entender melhor o que se passa na realidade do povo brasileiro, seja na favela, na floresta ou nos sertões.

Iracema - Uma Transa Amazônica (Clássicos do Cinema Brasileiro - 1)


Filmado em 1974, Iracema – Uma Transa Amazônica, de Jorge Bodansky, teve exibição proibida no Brasil por seis anos. É, sem dúvida, um dos mais importantes documentos que o cinema produziu na história do Brasil.

O filme trata da história da adolescente Iracema (Edna de Castro), que se envolve com o caminhoneiro Tião Brasil Grande (Paulo César Peréio). Os dois seguem pela rodovia Transamazônica, que, na época, era um dos motivos de ostentação do poderio do governo militar. A ditadura propagava que o Brasil era o país do futuro, do desenvolvimento, a potência do ano 2000.

Entretanto, o que os personagens encontram às margens da rodovia é muita miséria e descaso com a pobreza da região. Prostituição infantil, grileiros, contrabando de madeira (o próprio Tião é um contrabandista), queimadas e desmatamento são comuns naquela realidade até então desconhecida do resto do Brasil.

Mas talvez o mais interessante em Iracema não seja a denúncia em si, mas o modo como ela foi feita. Toda a equipe de produção do filme, incluindo o elenco, cabia dentro de uma Kombi, na qual o grupo se deslocava pela floresta para fazer as imagens. Há apenas dois atores profissionais no filme (Peréio e Conceição Senna).

Ao assistir Iracema, ficamos sem saber se estamos diante de documentário ou ficção. As duas coisas se misturam. Um dos motivos é que o filme não tinha um roteiro rígido definido. Os personagens interagem com pessoas reais. À medida que iam correndo a floresta, os atores conversavam naturalmente com pessoas em casas de prostituição, bares, restaurantes ou fazendas, e tudo era incorporado ao filme. Não havia ensaio. Tião provocava aquelas pessoas, com o discurso típico do governo militar.

Cultuado em festivais internacionais, Iracema caiu na censura da ditadura militar e só foi exibido no Brasil em 1980. No Festival de Brasília daquele ano, foi o mais premiado.

O diretor Jorge Bodansky conta que as queimadas na floresta eram tão comuns que ele se acostumou a vê-las e, por pouco, deixa de filmá-las. Porém, ao ver um gigantesco incêndio, ele colocou sua câmera 16mm na lateral da Kombi, deixou o filme rodando e pediu ao motorista que seguisse adiante. Essa tomada lateral foi a primeira imagem de queimada da Amazônia que correu o mundo. Até aquele instante, não havia consciência sobre o que era o desmatamento da Amazônia.

Creio que nem é preciso dizer mais nada para mostrar a importância deste filme. É bom parar por aqui, até porque quero que todos vocês assistam a Iracema. E depois me contem se gostaram ou não.

Só para completar: Fernando Meirelles, diretor de Cidade de Deus e O Jardineiro Fiel, disse que foi Iracema que o fez abandonar a faculdade de arquitetura para pensar em fazer cinema. Ainda em tempo: não procure neste filme um motivo pra se divertir e comer pipoca. Felizmente, ele é muito, muito mais do que isso.

sexta-feira, outubro 06, 2006

O que se passa na cabeça do povo

Passei estes últimos dias freqüentando debates que rolam nas seções de comentários de blogs e comunidades relacionadas à eleição pra presidente. Percebi uma clara tendência de eleitores dos dois lados em considerar que o povão (no caso, os mais pobres) está com Lula, enquanto a classe média alta e os ricos estão com Alckmin. Para muitos, a explicação está no fato de o Bolsa Família ser esmola, assistencialismo, compra de votos ou coisas que o valham.

Todos vocês, provavelmente, também já ouviram ou leram coisa do tipo. Este tipo de visão esbarra no preconceito que ronda a classe média, de que os pobres só querem saber de ter comida na mesa sem trabalhar. Esbarra no preconceito pregado por jornais como o Estado de S. Paulo, que em outra oportunidade disse que os pobres ligam menos para a corrupção do que os ricos.

Porém, de todas as fontes das quais obtive esse tipo de ponto de vista, nenhuma me pareceu ter argumentos sérios para comprová-lo. Este tipo de discurso se baseia apenas em suposições. Afinal de contas, ninguém pode ter certeza de que conhece as vontades do povo sem no mínimo ouvir o que ele tem a dizer.

É com base nisso que pretendo começar neste blog, a partir de hoje, uma pequena série de postagens intitulada Clássicos do Cinema Brasileiro. O que tem a ver uma coisa com a outra? Tem a ver que começarei a série relatando momentos do que foi talvez o principal e mais genial movimento do nosso cinema: o Cinema Novo, iniciado no final da década de 50 e mantido pelas duas décadas seguintes.

Dentre as premissas dos cineastas que participaram deste movimento, uma delas era a de retratar o povo brasileiro. Mas não aquele povo refeito em estúdios de gravação, e sim o povo cercado pela realidade de seu cotidiano. Desta forma, mostrou a distância entre os sonhos e a vida dos brasileiros, em tom de crítica e contestação. Ou seja, mostrava aquilo que até hoje nós, da classe média, temos dificuldade em compreender.

Os três primeiros filmes serão Vidas Secas, de Nélson Pereira dos Santos; Assalto ao Trem Pagador, de Roberto Farias; e Iracema – Uma Transa Amazônica, de Jorge Bodansky. São retratos da população carente do sertão nordestino, das favelas cariocas e da Amazônia, respectivamente. Três lugares distintos retratados. Em todos, porém, com sintomas semelhantes provocados pela miséria. Foram filmados há mais de 40 anos, mas permanecem atuais. Em breve, a primeira postagem da série. Espero que gostem.

quinta-feira, outubro 05, 2006

Sugestões de blogs

Há poucas semanas, resolvi voltar à blogosfera. Já havia abandonado o Diários de Kombi e resolvi me aventurar por este aqui. Constatei o que li várias vezes por aí: blogar vicia. E, por isso, além de passar horas relendo meu blog, comecei a ler outros. Gostei de vários. Alguns são de amigos e conhecidos, outros de pessoas que nunca vi na vida. Compartilho-os com vocês, começando pelos mais familiares.

O Blog do Camargos é mantido pelo meu antigo colega de redação do Estado de Minas, Daniel Camargos. Ao postar numa linguagem à Nélson Rodrigues, o Camargos diz ter a certeza de que blog rende sexo para gordos. A conferir.

Meu irmão mais velho, Victor Morais, disse que lendo o UaiPod teve vontade de escrever seu próprio blog. E lançou o Memórias de um Cirurgião Dentista. Tem depoimentos muito bons, vale a pena passar por lá.

Minha cunhada Ana Maria Gonçalves é blogueira desde criancinha e lançou este ano o belíssimo Um Defeito de Cor, futuro best-seller pela Editora Record. O primeiro livro dela, Ao lado e à margem do que sentes por mim, é independente e está postado no blog 100 meias confissões de Aninha.

Meu concunhado Idelber Avelar sustenta um dos mais influentes blogs que eu já vi: O Biscoito Fino e a Massa.

Guerra dos sexos. Dois caras que eu não conheço criaram há poucos dias o A Culpa é Dela, onde relatam experiências mal vividas com mulheres. Em compensação, quatro meninas que eu também não conheço mantêm há um bom tempo o Homem é Tudo Palhaço, onde relatam experiências mal vividas com homens. Visitem e divirtam-se.

Conheço o Márcio Pimenta apenas virtualmente, mas não deixo de visitar o blog dele. É sobre política, economia e cultura.

Em outra postagem, citarei mais blogs que visito.

Ligações perigosas na campanha Alckmin

Da seção História, da Folha Online, sobre o governo Fernando Henrique Cardoso:

"Mas a gestão de FHC não trouxe apenas boas notícias na área econômica. Foi marcada também pela aparição de fitas com gravações clandestinas de conversas sobre suposto esquema de favorecimento, que teria sido montado para a privatização do sistema Telebrás.

O episódio provocou a demissão de integrantes do governo, entre eles, Luiz Carlos Mendonça de Barros, então ministro das Comunicações, André Lara Resende, presidente do BNDES, Pio Borges, vice-presidente e diretor da área de desestatização do BNDES, e José Roberto Mendonça de Barros, secretário-executivo da Camex (Câmara de Comércio Exterior) e irmão Luiz Carlos."

Isso lembra alguma coisa os atuais escândalos envolvendo o PT? O então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, alegou que não sabia de nada a respeito da série de denúncias que envolveu vários de seus comandados no caso da privatização da Telebrás.

Muito bem. Já se vão dez anos deste caso. Mas o ex-ministro de FHC Luiz Carlos Mendonça de Barros deu recentemente entrevista à revista Exame (agradecimentos ao Blog do Márcio Pimenta). Atualmente, ele é o guru econômico da campanha de Geraldo Alckmin à presidência da república e, portanto, candidato a ministro da Economia. Reparem no conteúdo de algumas das declarações dele:

"EXAME -­ O que o senhor acha que deveria ser privatizado?
Mendonça -­ Há muita coisa ainda, como os serviços portuários, as estradas de rodagem, o setor elétrico, a Petrobras.

EXAME ­- A privatização da Petrobras seria extremamente polêmica, não?
Mendonça -­ Sem dúvida. Ainda não tenho opinião formada sobre o assunto, mas se eu estivesse no próximo governo, trabalharia forte na privatização da Petrobras. (...). "

quarta-feira, outubro 04, 2006

Ligações perigosas em Minas

Na metade do ano passado, vários repórteres da grande imprensa desembarcaram Belo Horizonte ávidos por desmascarar o escândalo do mensalão. O fio da meada que poderia sujar as mãos de centenas de políticos ligados ao governo federal estaria em BH, pois aqui estão as empresas de Marcos Valério. Quase um ano e meio depois, o tema da corrupção continua recorrente no debate, ainda mais neste segundo turno da eleição presidencial. Vamos a uma breve discussão sobre o mensalão pra tentar jogar mais dúvida nas nossas cabeças.

Primeiro, algumas constatações. O mensalão atingiu em cheio o PT de São Paulo. Vários congressistas-petistas-paulistas caíram na mídia por conta do escândalo, sobretudo o ex-ministro José Dirceu. Em Minas, porém, o foco da crise foi outro: a oposição. Na política mineira, dois nomes ganharam destaque como envolvidos na crise: Eduardo Azeredo (PSDB) e Roberto Brant (PFL).

O envolvimento dos dois no escândalo contribui para referendar a tese de que o mensalão era mais um esquema de caixa-dois do que um simples pagamento de propina para aprovação de projetos de interesse do governo no Congresso. Pelo que se tem notícia até o momento, o esquema teve início na campanha de Azeredo ao governo de Minas, em 1998. Marcos Valério teria montado, de acordo com as denúncias que rolam por aí, o esquema de caixa de campanha do PSDB naquela ocasião.

Vamos lançar, agora, mais um nome nessa discussão: Clésio Andrade. Ex-PFL e atualmente filiado ao PL, foi candidato a vice-governador na chapa de Eduardo Azeredo em 1998 e é atual vice do Playboy Almofadinha. Clésio é, ainda, presidente da Confederação Nacional do Transporte (CNT), entidade que representa os empresários do setor de transporte.


Antes de disputar a eleição de 1998, Clésio desfez a sociedade que tinha com Marcos Valério na agência de publicidade SMPB, atolada até o pescoço no escândalo do mensalão. O motivo do fim da parceria seria justamente a evitar suspeitas sobre licitações envolvendo publicidade estatal. Azeredo e Clésio, entretanto, perderam aquela eleição para a dupla Itamar Franco e Newton Cardoso (PMDB). Patrus Ananias (PT) ficou em terceiro lugar.

Clésio voltou na eleição seguinte como vice do Playboy Almofadinha. Desta vez, ele ganhou. E, na primeira metade do atual governo, a mídia propagou com letras maiúsculas o “sucesso” do chamado choque de gestão, alcançado por um suposto déficit zero das contas do estado (leia matéria da Folha sobre as estratégias do governo estadual para chegar ao déficit zero). A imprensa estava, no caso, reproduzindo os dizeres de uma megacampanha publicitária bancada pelo dinheiro dos nossos impostos e executada por quem? Pela SMPB, de Marcos Valério e ex-Clésio Andrade.

Concordam que existe aí um interessante fio da meada que os repórteres poderiam ter encontrado por aqui? Aparentemente, ninguém quis investigar essas ligações perigosas. Mesmo que seja para descobrir que não há sujeira nessas ligações, era preciso investigar. Porém, há uma lei da mordaça, imposta sabe-se lá com quais métodos pelo atual governo estadual. Ao que tudo indica, ela deve continuar pelos próximos quatro anos e deve ser a alavanca para a campanha presidencial do Playboy.

Em tempo: Eliseu Resende (PFL) foi eleito senador por Minas Gerais, com mais da metade dos votos. Eliseu tem 78 anos e, se chegar ao final do mandato de oito anos, terá 86. Caso não chegue, assume seu primeiro suplente, Clésio Andrade.

Preço alto dos DVDs: a culpa não é da pirataria

Outro dia publiquei esta postagem sobre o McDonnalds e o documentário Super Size Me – A Dieta do Palhaço, do diretor e auto-cobaia-humana Morgan Spurlok. Hoje, vamos discutir outro tópico do panfleto do mês passado da rede de comida rápida. Só pra lembrar, o McDonnalds propunha, em suas bandejas, algumas atitudes para salvar o mundo fazendo coisas simples. Uma delas é esta:


Reforço que escaneei pela minha webcam, daí a pouca qualidade da imagem. A recomendação é a seguinte: não compre produtos pirateados. Eles são ilegais, e sua produção conta com trabalho infantil e subemprego. Sem querer, a lanchonete me deu uma boa oportunidade pra discutir um assunto que há muito venho querendo falar: a pirataria - no caso, de CDs e DVDs.

A mídia divulga há muito tempo que os Estados Unidos estão insatisfeitos com a ineficiência do combate à pirataria na América Latina e, sobretudo, no Brasil. A princípio, a reclamação parece justa, pois a coisa mais fácil do mundo é comprar um CD ou DVD genérico em camelôs das grandes cidades. Logo, se tem alguém pirateando, com certeza tem alguém perdendo. No caso, quem? Vejamos.

A tropa de choque do combate à pirataria de CDs e DVDs é composta por seis gravadoras que comandam o mercado brasileiro. Nenhuma delas é nacional. São essas gravadoras que escolhem quais gêneros musicais ou bandas irão fazer sucesso no Brasil. Escolhem a dedo e utilizam da pior forma de divulgação possível para emplacar novos sucessos: o jabá.

Para os mais desavisados, o jabá é uma quantia em dinheiro, expressa na prestação de contas das gravadoras como verba de divulgação, destinada a rádios e emissoras de televisão. As gravadoras pagam em dinheiro vivo para que as músicas de trabalho de suas bandas sejam bombardeadas incessantemente. Como resultado dessa lavagem cerebral, o público acaba aceitando os hits escolhidos pelos donos do dinheiro. A impressão que nos fica é de que o sucesso é espontâneo e não programado.

Pois bem, após escolherem os sucessos e pagarem centenas de rádios pelo Brasil (algumas redes chegam a cobrar R$ 20 mil reais pela divulgação), as gravadoras lançam os CDs ou DVDs e nos empurram preços acima de R$ 30. E usam o argumento de que a pirataria é a responsável pelo preço alto.

Argumento que, aliás, é falso. Fosse ele verdade, não faria sentido as mesmas gravadoras adotarem outra estratégia no paraíso da pirataria, a China. É no Oriente que são produzidos a maioria dos produtos pirateados e, para combater a falsificação por lá, as empresas resolveram adotar uma estratégia diferente: baixaram o preço dos DVDs. Tanto é que o DVD do último filme do Super-Homem, a ser lançado pela Warner, chega à China custando apenas R$ 3,40.

Nessa hora sinto pena de nós, latino-americanos. Os chineses podem pagar barato. Nós, não. E o pior é o argumento de que a pirataria é a causa do preço alto. Será mesmo?

Pílula 1 Em outro post, irei propôr alternativas para fugir do jabá. Bandas e ouvintes podem usar a internet para o bem.

Pílula 2 Se tudo der certo, em breve estarei produzindo, junto com uma banda de música pop do interior de Minas, um videoclipe e um material de divulgação. Prentendemos embarcar pela linha alternativa, sem jabá, sem gravadora, sem nem lançar CD. Torçam para que dê certo. Mais notícias em breve.